Travessa do Noronha

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Travessa do Noronha. Família detentora da Quinta do Monte Olivete no século XVI.

Este arruamento refere-se à família Noronha, associada por casamento de D. Maria de Noronha (c.1545 – 1623), com Fernão Teles de Meneses (1530-1605), detentor da Quinta do *Monte Olivete, terreno outrora existente neste local.

Natural de Santarém, descendeu de uma família nobre não titulada. Esteve intimamente envolvido nas campanhas portuguesas na Índia, tendo acompanhado várias expedições dos vice-reis, designadamente D. Antão de Noronha (1564-1568) em  1568, e D. Luís de Ataíde (1517-1581) em 1570, a quem sucedeu a título interino após a sua morte enquanto Governador da Índia, até 17 de Setembro de 1581, data em que entregou o governo a D. Francisco Mascarenhas (c.1530-1608), novo vice-rei nomeado por D. Filipe I (1527-1598).

Tendo jurado fidelidade ao rei espanhol, ocupou cargos destacados em instituições criadas e regimentadas pela Coroa, de que se destacam a regência da Casa da Suplicação (decorrente da extinção da Casa do Cível por carta régia de 27 de Julho de 1852) e a presidência do Conselho da Índia (criado por Regimento de 26 de Julho de 1604). Pertenceu também ao Conselho de Estado, Governador e Capitão-Geral do Algarve e General da Armada.
Do seu casamento com D. Maria de Noronha (c.1545-1623), filha de D. Francisco de Faro, vedor da fazenda de D. Sebastião (1554-1578) e do cardeal-rei D. Henrique (1512-1580) e irmã de D. Francisco de Faro, 1.º Conde do Vimieiro (1560-1617), não existiram filhos.

A Quinta do Monte Olivete, propriedade do casal, assumiu um papel preponderando na resolução de problema gerado pela deliberação decorrente da 14.ª Congregação Geral da Companhia de Jesus de 1565: todas as províncias estavam obrigadas a erigir Noviciados, unidos ou separados dos colégios. Deste modo, na Congregação Provincial de 1572 da província Lusitânia, optou-se pela união dos Noviciados aos colégios já existentes, assegurando desse modo a sua subsistência financeira. No entanto, em 1587, o Superior Geral Cláudio Acquaviva (1543-1615) autorizou em Congregação Provincial a fundação de um Noviciado separado das casas já existentes na cidade de Lisboa.
Neste contexto, no dia 18 de Setembro de 1589, foi celebrada uma escritura em Lagos entre os Padres da Companhia de Jesus, Fernão Teles de Meneses e D. Maria de Noronha, na qual estes se comprometem a fundar o Noviciado mediante a doação de 20 mil cruzados. Estipulou-se que o casal iria receber a patente de fundadores da casa.

No dia 26 de Dezembro de 1597 foi celebrada nova escritura, desta vez entre o Padre Provincial de Portugal, Fernão Teles de Meneses e D. Maria de Noronha, onde se declara o recebimento da totalidade da verba para a fundação do Noviciado. Após superação de dificuldades dos arquitectos na escolha do local exacto para a construção do edifício no Monte Olivete (região da Cotovia), foi celebrada uma missa celebrada pelo Padre Provincial Cristóvão de
Gouveia no dia 18 de Dezembro, na qual o Noviciado foi dedicado a Nossa Senhora da Assunção. Foi nomeado como reitor do Colégio o Padre António de Mascarenhas e o seu primeiro noviço foi António de Azeredo, um fidalgo que lutou em Álacer-Quibir.
No dia 23 de Abril de 1603 foi lançada a primeira pedra para a construção do edifício, que não chegaria a ficar concluído a tempo de ser visto por Fernão Teles de Meneses, que viria a falecer dois anos depois, no dia 26 de Novembro de 1605.

Em 1607, D. Maria de Noronha pressiona o arquitecto régio Baltasar Álvares (1560-1630), responsável pela obra, a concluir a capela-mor, por forma sepultar o seu marido no seu terreno, uma vez que se encontrar na sacristia da Igreja de São Roque. Mas terá sido apenas em 1616 que a igreja ficou concluída e por consequência a transladação efectuada para um túmulo com 6,5 metros de altura, construído com mármore rosa liso e assente sobre dois elefantes, contendo duas arcas de couro destinadas aos restos mortais de Fernão Teles de Meneses e D. Maria de Noronha. Na face do túmulo existe uma placa com o epitáfio no qual se poderá ler:
“Aqui jaz Fernão Telles de Menezes; filho de Braz Telles de Menezes, camareiro-mór, guarda-mór e capitão dos ginetes do Infante D. Luiz, e de Gatharina de Brito sua mulher — o qual foi do Conselho de Estado de El Rey Nosso Senhor e governou os estados da índia e o reino dó Algarve e foi regedor das justiças da Casa da Suplicação e presidente do Conselho da índia e partes ultramarinas. E sua mulher D. Maria de Noronha, filha de D. Francisco de Faro, vedor da Fazenda dos reis D. Sebastião e D. Henrique e de D. Maria de Albuquerque sua primeira mulher; os quais fundaram e dotaram esta casa de provação da Companhia de Jesus e tomaram esta capela-mór para sua sepultura.”

No dia 13 de Junho de 1619, a então designada casa do Noviciado de Nossa Senhora da Assunção da Cotovia foi inaugurada, assinalando-se a transferência da comunidade que até à data ocupara as instalações da Quinta de Campolide. A cerimónia de inauguração foi descrita pelo Padre António Franco:
“Tudo foy pondo em execussão o irmão Lombardo, e no anno de mil seiscentos, e dezanove tinha accomodado a caza em forma, que pudessem nella entrar a viver os Noviços. Por tanto se dispoz a nova dedicação em dia de Sancto Antonio do dito anno. Neste dia estava bem armada a Capella interior da caza nos arredores de sima. Nella se armou altar com imagem de vulto glorioso Sancto Antonio. Tinhão vindo de Coimbra nove Irmãos Noviços, e seis de Évora, com os quais se deu princípio ao Noviciado.”

Quatro anos volvidos, no dia 7 de Março de 1623, faleceu D. Maria de Noronha, continuando esta instituição em operação até à ascensão do Marquês de Pombal ao poder, momento em que, com a expulsão dos Jesuítas, converteu este edifício no *Real Colégio dos Nobres (1761), o qual posterior deu lugar à *Escola Politécnica (1837), que alojou, a partir de 1858, o Real Museu de História Natural. Neste espaço funciona actualmente o Museu Nacional de História Natural e da Ciência.

Em meados do século XIX, o túmulo de Fernão Teles de Meneses e de D. Maria de Noronha foi transferido da capela-mor para as cavalariças da Escola Politécnica em consequência da Revolução Setembrista de 1836, a qual pressupunha o ensino secular, erradicando por isso a influência da Igreja. Entre 1850-60, as mesmas cavalariças foram convertidas em casas de função para os funcionários da Escola Politécnica. Segundo o historiador e museólogo Fernando Baptista Pereira (n. 1953), o túmulo encontrava-se no quarto de um dos ocupantes que, nunca tendo obtido resposta da reitoria após ter requerido que dali o removessem, construiu uma parede de tabique, votando-o ao esquecimento. Aproximadamente 150 anos depois, em 9 de Abril 2011, a parede de tabique foi derrubada e o túmulo redescoberto, encontrando-se hoje em dia exposto no Museu Nacional de História Natural e da Ciência.

Designado Travessa do Noronha, este arruamento inicia-se na Rua do Noronha, não tendo saída.

Bibliografia

Martins, Fausto (s.d.). Devoção e culto a Santo António “Lusitano” na Companhia de Jesus: séc. XVI-XVIII in Carlos Alberto Ferreira de Almeida. In memoriam. Vol. II. Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto.

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