Travessa do Salitre

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Salitre. O local em que se encontra foi mencionado pela primeira vez em 1665 nos Livros dos Óbitos da freguesia de São José: “Pátio do Salitre”, designação que se manteve até 1746.

Tratava-se de uma horta próxima de Valverde herdado por D. Jorge de Ataíde (1535-1611), Capelão-mór do Cardeal-Rei D. Henrique I (1512-1580). Anos antes de falecer, em 1609, D. Jorge doou essa horta, na altura designada “da Palmeira” aos religiosos cartuxos. Conseguiu igualmente legar a esta Ordem os terrenos em Caxias, onde foi erigido o Convento das Laveiras, por via de um pedido endereçado ao Rei D. Filipe II (1578-1621), que para o efeito obteve do Papa Clemente VIII (1536-1592) a Bula “Circa Curam” na qual se licenciava a transferência da propriedade.

A ordem da Cartuxa da Torre, ou Ordem dos Cartusianos foi fundada em 1084 na Cartuxa por Bruno de Hartenfaust (c.1026-1101), mestre da escola da Catedral de Reims e professor do Papa Urbano II (1042-1099), que reconheceu a formação desta Ordem e o convidou para seu conselheiro.
O responsável pela introdução desta comunidade em Portugal em 1598 foi D. Teotónio de Bragança (1530-1602), Arcebispo de Évora.

Em Lisboa, foi nesta horta doada por D. Jorge de Ataíde que os também, conhecidos por frades Brunos, erigiram o Hospício do Monte Olivete, ou da Palmeira aí permanecendo até à Reforma Geral Eclesiástica em 1834. Este terreno estendia-se até à zona da *Alegria, onde existiam várias casas e hortas arrendadas a cidadãos lisboetas.

A actual designação “Salitre” surgiu pela primeira vez em 1710 nos registos da freguesia de São José. O salitre consiste numa designação associada ao nitrado de sódio ou ao nitrato de potássio, cujas aplicações se estendem à preservação de alimentos, fertilização dos solos e ao fabrico de pólvora. A sua produção remonta pelo menos ao século XV, demonstrando-se fulcral para assegurar a capacidade bélica do reino.
*Gustavo de Matos Sequeira (1880-1962) justificou a designação deste arruamento pela existência de uma nitreira nesta horta através de uma carta redigida pelo Mestre Nitreiro Manuel Francisco da Cruz endereçada ao especialista Luís Tomás Regnault, pertencente a documentação relativa à Real Nitreira do Braço de Prata:

“(...) esta horta he dos P" Brunos anda arrendada por 40.000 reis por anno, quando o seu valor será de 25; porem ainda assim mesmo o rendeiro se não contentará com pouco pelo trespace em razão de estar ali arranjado há muitos annos com a sua familia, porem nesta parte se pode arranjar de forma que todos fiquem bem, fazendo-o ocupar no trabalho da mesma nitreira.
Presentemente parece não terá arrendamento serto por se lhe ter acabado o que tinha, e ficar continuando visto pagar bem etc. O terreno da horta he bom e bom posso de ágoa porem não tem cousa de casas que possam servir.”

Em 1802, o Tenente-Coronel do Real Corpo de Engenheiros e Insperctor-Geral das Nitreiras e Fábrica da Pólvora de Minas Gerais, Manuel Jacinto Nogueira da Gama, proferiu na Secção Pública da Sociedade Real Marítima, Militar e Geográfica uma comunicação intitulada “Memória sobre a absoluta necessidade, que ha, de Nitreiras nacionaes para a independência e defensa dos Estados com a descripção da origem, actual estado, e vantagens da Real Nitreira Nacional de Braço de Prata”. Publicada em 1803 pela Impressão Régia, nas mais de oitenta páginas surge a todo o passo a referência ao fabrico de pólvora e a sua directa associação à produção e recolha de salitre a partir de nitreiras naturais e artificiais.
Este arruamento tinha a designação anterior de Travessa das Vacas por aí existirem casas onde se fazia a recolha destes animais, bem como de burros e cabras associados a essas hortas.

Designado Travessa do Salitre, este arruamento inicia-se na Praça da Alegria, terminando na Avenida da Liberdade por Deliberação Camarária de 20 de Maio de 1897 e respectivo Edital de 28 de Maio do mesmo ano.

Bibliografia

Branco, Manuel Bernardes (1888). História das Ordens Monásticas em Portugal. Lisboa: Livraria Editora de Tavares Cardoso & Irmão;
Gama, Manuel Jacinto Nogueira da (1803). Memória sobre a absoluta necessidade, que ha, de Nitreiras nacionaes para a independência e defensa dos Estados com a descripção da origem, actual estado, e vantagens da Real Nitreira Nacional de Braço de Prata. Lisboa: Impressão Régia;
Sequeira, Gustavo de Matos (1916). Depois do terremoto. Subsídios para a história dos bairros ocidentais de Lisboa. Lisboa: Academia das Sciências de Lisboa.

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